Contentamento em um Mundo Descontente

Contentamento em um Mundo Descontente

Para o cristão, o contentamento é uma joia mais preciosa do que esse diamante vermelho extremamente valioso. Em 1642, o pastor puritano Jeremiah Burroughs pregou uma série de sermões sobre o contentamento cristão que foram reunidos e publicados em 1648, dois anos após sua morte. O título que os editores escolheram foi The Rare Jewel of Christian Contentment ( A Joia Rara do Contentamento Cristão). Ela leva o leitor a um poderoso desdobramento deste tema vital, começando com a afirmação do apóstolo Paulo em Filipenses 4.12, “Aprendi o segredo de viver contente em toda e qualquer situação” (NVI). Infelizmente, muitos cristãos no século XXI nunca se aprofundaram no tema do contentamento. Como a rocha lamacenta escavada na margem de um rio brasileiro, seu verdadeiro valor tem sido escondido de muitos olhos por séculos. Desejo que um número cada vez maior de cristãos experimente o tipo de contentamento que Paulo descobriu e o qual Burroughs tão habilmente descreveu. Seu valor na eternidade provará ser muito maior do que o do diamante vermelho. Por que eu digo isso? Considere o seguinte cenário hipotético: imagine que você acabou de ganhar o prêmio de sorteio mais extraordinário de todos os tempos, mas ele veio por meios sobrenaturais. Vamos chamá-lo de “Agência de Viagens Faustiana”, de propriedade e operada por um certo Sr. Mefistófeles.

O prêmio é uma viagem de duas semanas com todas as despesas pagas em qualquer parte do mundo. Você ficará nos hotéis cinco estrelas mais caros, comerá a comida da melhor qualidade, feita pelos melhores chefs do mundo. Você verá o cenário mais espetacular, dirigirá os carros mais caros e usará um vestuário totalmente novo, feito sob medida para você. A viagem terá o melhor de tudo e atenderá a todos os seus caprichos.

Mas aqui está a pegadinha: você teria que concordar em estar continuamente descontente em cada momento da viagem. Você faria isso? Duas semanas de descontentamento constante no cenário mais luxuoso possível? Para muitas pessoas, eu acho que a resposta pode ser bem clara: “De jeito nenhum! Por que eu iria querer ficar infeliz por duas semanas seguidas?” Na verdade, vemos muitas das pessoas mais elitizadas do mundo vivendo essencialmente esse tipo de tragédia na vida real. Atletas e famosas estrelas de cinema vivendo em mansões espetaculares em suas propriedades privadas em costas rochosas, com projetos arquitetônicos que maximizam a vista do nascer do sol ou do pôr-do-sol sobre o oceano. Apesar disso, vivem tragicamente descontentes, indo de divórcio em divórcio, viciados em drogas, entediados, até suicidas.

Inversamente, suponha que uma oferta diferente tenha sido feita a você, pelo seu Pai celestial. Ele está oferecendo uma dolorosa provação de sofrimento. Você será espancado publicamente, preso em um calabouço sombrio com seus pés em troncos. Você será privado de comida, água, cuidados médicos e até mesmo de luz. À sua volta estarão outros prisioneiros sofredores, o mau cheiro dos fluidos corporais humanos, e o tipo de desespero que vem quando o fim de sua agonia não está à vista. Mas você também será preenchido com um contentamento tão sobrenatural por meio da presença de Deus que mais tarde você se lembrará daquela época como um dos momentos mais doces de sua vida. E você terá o privilégio de levar uma família inteira a Cristo (ver At 16.16-34). Qual oferta você aceitaria? Se você é cristão, é possível que você escolha a segunda experiência, apesar do alto custo que a acompanha. E se assim for, você provavelmente já concorda que o contentamento é o maior estado de bem-estar interior que alguém poderia ter nesse mundo.

O valor do contentamento é superior a qualquer outro que o diamante vermelho possa trazer. No entanto, apesar do valor desse rico, pleno e contínuo contentamento, e apesar do fato de ser possível que todos os cristãos do mundo o experimentem, essa joia requintada é rara em nossas vidas. E como o mundo não salvo precisa desesperadamente dos cristãos para descobri-la.

Nesse mundo trágico, estamos rodeados de pessoas descontentes. A cada minuto do dia, é possível ver evidências desse descontentamento inquieto na forma como elas reagem às circunstâncias. Mostram seu descontentamento enquanto dirigem, porque o trânsito é muito lento. Ou talvez o tempo esteja muito quente, muito chuvoso ou muito úmido. Ou em seus empregos as pessoas não es-tão sendo bem remuneradas ou recebendo crédito suficiente pelo trabalho árduo que realizam. Ou porque não suportam seus colegas de trabalho. As pessoas se sentem profundamente desapontadas com seus casamentos ou com a forma como seus filhos têm se saído. Seus corpos são muito gordos ou não são bonitos o suficiente. Atrapalhadas pelo descontentamento, as pessoas, muitas vezes, compram coisas das quais não precisam a fim de melhorarem suas perspectivas de vida. Muitos tentam encontrar seu caminho para a felicidade buscando em conselheiros a cura para suas infâncias disfuncionais. O descontentamento com o amor que não encontraram aparece nos seus olhos cobiçosos e errantes nas festas do escritório. Suas perspectivas escurecem quando essas pessoas pegam o trem metropolitano para mais um dia nos mesmos empregos que as tem aprisionado durante anos.

O descontentamento inquieto do mundo dos não cristãos não surpreenderá muitos crentes que procuraram ganhá-los para Cristo. Percebemos que a Escritura revela a verdadeira condição espiritual dos perdidos: eles estão “sem esperança e sem Deus no mundo” (Ef 2.12; NVI). As pessoas perdidas são “aflitas e desamparadas, como ovelhas sem pastor” (Mt 9.36; NVI). A escravidão delas aos poderes invisíveis das trevas (Ef 2.1-3) significa que compartilham com Satanás e com os demônios a mesma inquietação que as fazem vaguear pela terra, procurando constantemente algum tipo de descanso, mas sem encontrar nenhum (Jó 1.7; Mt 12.43). A condição espiritual dos perdidos e a escravidão ao pecado garante que eles nunca poderão encontrar o verdadeiro descanso e a verdadeira paz, essenciais para o genuíno contentamento. Isaías o disse claramente: “Mas os perversos são como o mar agitado, que não se pode aquietar, cujas águas lançam de si lama e lodo. Para os perversos, diz o meu Deus, não há paz” (57.20-21).

Esse descontentamento agitado dos incrédulos explica muitos dos terríveis eventos que acontecem no planeta Terra. Governantes poderosos, descontentes com o tamanho de seus domínios, saem em conquistas gananciosas, deixando um rastro sangrento de morte e destruição ao longo das páginas da história. Todo crime que rasga a trama da sociedade vem de pessoas descontentes, viciadas em drogas, álcool, dinheiro, poder ou prazer sensual e que estão dispostas a destruir a vida de outras pessoas para conseguir o que suas almas inquietas exigem. Todo casamento que termina em divórcio começa essa trágica jornada em um coração descontente. Embora não possamos dizer que cada miséria nesse mundo comece com o descontentamento humano, podemos afirmar com segurança que todo o sofrimento do mundo é exponencialmente intensificado pelo fracasso em encontrar um genuíno contentamento em meio a toda e qualquer circunstância.

Como cristãos, não devemos nos surpreender com nenhum desses diagnósticos do mundo incrédulo. Mas a grande tragédia é que muitas vezes não parecemos viver de maneira muito diferente. Muitos cristãos quase nunca experimentam o gosto diário do céu provido pelo Espírito Santo que vive dentro de nós (Ef 1.13). Muitos demonstram altos níveis de descontentamento em todas as mesmas circunstâncias que acabo de listar, e em inúmeras outras. Muitos de nós estamos inquietos, buscando algo de valor em nossa vida, mas sem encontrar. Muitos são espiritualmente imaturos, incapazes de lidar até mesmo com as menores aflições e inconveniências sem verbalizar nossas queixas a quem quer que as escute. Muitos cristãos vivem tão descontentes que nunca são solicitados por nenhum dos descrentes igualmente descontentes que os cercam pois, não conseguem apresentar uma razão para a esperança que eles têm (1Pe 3.15), porque evidentemente eles não têm nenhuma esperança. O que torna isso ainda mais surpreendente é que, por mais de dois séculos e meio, os desenvolvimentos na ciência, na indústria, na economia e na medicina têm reduzido de forma constante e sistemática as misérias físicas comuns a todas as gerações precedentes da humanidade.

A Revolução Industrial trouxe um progresso tecnológico surpreendente ao mundo, resultando em dispositivos que economizam mão de obra, novas fontes de energia, avanços surpreendentes nos transportes, encanamentos internos e casas com fiação para eletricidade. Aquecimento e ar-condicionado regulam a temperatura que nos cerca em quase todos os momentos. Os refrigeradores nos permitem manter os itens perecíveis mais frescos por mais tempo, os e sistemas de entrega das terras agrícolas para nossas casas garantem que um fluxo constante de alimentos deliciosos e acessíveis manterá nossas famílias comendo como a realeza. Os pesquisadores médicos nunca param de procurar remédios para doenças e enfermidades que tornam a vida tão miserável. E temos uma clara expectativa de que alguém, em algum lugar, está aplicando a genialidade tecnológica para remover da vida diária toda e qualquer aflição dolorosa. Dizemos: “Se fomos capazes de colocar um homem na lua, certamente poderemos curar a gripe comum”. A revolução digital tem sido um milagre da ciência moderna e nossos smartphones impressionantemente pequenos trazem o mundo inteiro às nossas mãos instantaneamente.

No entanto, apesar de todos esses avanços, estamos mais descontentes do que nunca. Gregg Easterbrook escreveu um livro exatamente sobre esse tema intitulado The Progress Paradox: How Life Gets Better While People Feel Worse (O paradoxo do progresso: Como a vida melhora enquanto as pessoas se sentem pior). Nos países do Primeiro Mundo, ele argumenta que, apesar dos avanços que acabou de catalogar, tenham melhorado materialmente o nível de conforto físico de todos nessas sociedades, os índices de depressão e psicose continuam a aumentar. As pessoas veem que suas vidas não têm sentido e parecem não conseguir encontrar nenhum remédio para combater a praga de seu próprio descontentamento consistente. Um exemplo claro é o transporte de longas distâncias. Nunca foi tão fácil, e mesmo assim ainda reclamamos! Lembro-me de ter estado recentemente em um terminal de aeroporto novinho em folha, lendo um registro histórico dos Peregrinos no Mayflower atravessando o Atlântico Norte em condições perigosas, em novembro de 1620.

Essas pessoas intrépidas viveram por muitas semanas na área escura e lotada abaixo do convés, comendo biscoitos frios e suportando o fedor do vômito causado pelo movimento do pequeno navio incessantemente agitado. Uma mulher até deu à luz nesse ambiente. Enquanto eu lia esse livro, ouvi um homem de negócios, bem vestido, falando ao celular com imenso aborrecimento: “Sim, foi um pesadelo total! Estávamos sentados na pista por mais de uma hora antes de finalmente decolarmos! Agora eu provavelmente vou perder meu voo de conexão!” A voz dele se afastou enquanto passava por mim, e ri comigo mesmo da perspectiva dele. Ele certamente não estava pensando como somos abençoados por sermos capazes de cobrir milhares de quilômetros por via aérea no espantoso conforto de um jato moderno. Não precisamos embarcar em um minúsculo veleiro de madeira e atravessar um oceano aterrorizante. Também não temos que carregar um vagão Conestoga (transporte utilizado no final do século 18) com semanas de provisões e cruzar rios agitados em uma perigosa viagem até o Território do Oregon.

Outro fator que gera descontmento é que estamos mais conscientes do que nunca acerca da miséria geral da raça humana. Nossos smartphones nos ligam a aplicativos de notícias que nos mantêm atualizados sobre as principais ocorrências ao redor do mundo, derramando um fluxo constante de sofrimento em nossa consciência. Estamos imediatamente cientes de um devastador terremoto no Oceano Índico e do subsequente tsunami que extermina comunidades inteiras e mata milhares de pessoas. Ou ouvimos falar de mais um ataque terrorista em Londres, ou em Paris, ou em Madri que resultou na morte ou na mutilação de dezenas de pessoas. Além disso, lemos sobre um vírus para o qual não há cura, originado na África Ocidental e que ameaça se espalhar por transportadores humanos por meio de viagens aéreas para locais metropolitanos no mundo todo. Vivemos num mundo de miséria no qual pouquíssimos encontram contentamento duradouro.

É nesse cenário pulsante e em ebulição de infelicidade inquietante que desejo redescobrir a joia rara do contentamento cristão – primeiro, a partir das Escrituras e depois de Burroughs – e fazer brilhar sua antiga luz de forma radiante para o leitor do século XXI. O contentamento tem o poder de trazer paz sobrenatural e eterna fecundidade em toda e qualquer circunstância que enfrentaremos e é, portanto, muito mais valioso do que o deslumbrante diamante vermelho de Moussaieff. Minha tese para esse livro é que o contentamento cristão é encontrar deleite no sábio plano de Deus para minha vida e humildemente permitir que ele me dirija nesse processo. Meu objetivo é que mostremos mais consistentemente o contentamento cristão de forma que, no final, Deus será glorificado em nossas vidas diárias, seremos mais alegres, e nos tornaremos fontes de inspiração para aqueles que nos observam busquem o Salvador, o único por meio de quem eles podem ter esse mesmo contentamento sobrenatural.

Texto extraída do livro “Poder do Contentamento Cristão”

Em 1643, o pastor puritano Jeremiah Burroughs escreveu um livro intitulado The Rare Jewel of Christian Contentment (A Joia Rara do Contentamento Cristão) que tem tanta reverberação nos nossos dias marcados pelo descontentamento como teve nos dias do autor. Agora, o pastor e escritor Andrew M. Davis nos ajuda a redescobrir as verdades profundamente marcantes encontradas naquela obra tão esquecida de Burroughs. Com novas e poderosas ilustrações e um apurado senso de tudo que perturba os cristãos modernos, Davis nos desafia a confrontarmos as fontes do descontentamento em nossas vidas abraçando o ensino do apóstolo Paulo sobre o contentamento em todas as circunstâncias.

Quem está no comando: Alma ou Cérebro

Quem está no comando: Alma ou Cérebro

Texto extraído do livro “A Culpa é do Cérebro – Capítulo 1”

“Acho que tenho um desequilíbrio químico. O que devo fazer?”

“Meu filho deveria tomar Ritalina?”

“Por que meu pai está agindo desta forma? A doença de Alzheimer o mudou tanto.”

“Desde que sofreu o acidente, meu filho tem sido demitido de 25 empregos. Será que ele vai ter que morar conosco pelo resto de nossa vida?”

“Eu estou com raiva porque Deus me fez um alcoólatra. Outras pessoas não precisam lidar com isso. Por que ele me deu esta doença?”

“É duro parar de frequentar bares de gays e ver pornografia na internet. Como posso parar com isso uma vez que tenho uma orientação homossexual?

Estas são algumas das novas perguntas que fazem com que ajudar outras pessoas pareça algo mais complicado hoje em dia. Gostamos de pensar que a Bíblia é suficiente nas questões críticas da vida, mas estas questões desafiam essa suposição. Afinal, o que teria a Bíblia a dizer acerca de desequilíbrio químico, Ritalina ou alcoolismo como doença? Talvez todo amigo, conselheiro, discipulador e pastor deveria ter seu conhecimento bíblico complementado por cursos em genética, neuroquímica ou doença e dano cerebral.

Porém, há uma abordagem alternativa. Considere isto: o que é ou não preciso mais necessariamente para uma maior sofisticação no entendimento do cérebro. O inverso, o que seria necessário está examinado nas Escrituras em maior profundidade e de modo prático sobre aquilo que é relevante nestas questões. Então podemos utilizar as observações das ciências cerebrais a fim de ilustrar a posição bíblica. Nossa tarefa começa ouvindo a discussão que tem existido por séculos. Ela diz respeito à alma (também chamada de mente), o cérebro e como eles se relacionam.

A ALMA E O CÉREBRO

Por séculos o cérebro tem sido objeto da fascinação humana. “Seria este realmente o centro da alma elusiva? Se for, onde exatamente está a alma?” questionam os físicos e filósofos. Há muito tempo, por volta do século 15 a.C., o físico Alemão Alkmeon de Crotona propôs uma razoável teoria sadia. Ele sugeriu que a informação sensória tal como a visão e som eram mais terrenos e ocupavam distintas áreas cerebrais. Pensamentos, por outro lado, eram espirituais. Eles eram parte da imortal, alma imaterial e não poderiam ser fisicamente localizados.

Platão declarou que o cérebro era supremo entre os órgãos do corpo, porém suas razões foram peculiares. Ele pensava que a parte mais baixa que rodeava o cérebro, agora denominada de medula, seria onde Deus plantou e enclausurou a alma. Aristóteles não estava tão seguro disso. Ele pensava que o coração era o local onde se encontrava a alma humana. O cérebro seria meramente um tipo de radiador ou uma “chaleira” que tanto aquecia como esfriava o sangue.

Estratão de Lâmpsaco encontrou a alma entre as sobrancelhas! Shakespeare, seguindo o filósofo grego, escreveu que a alma estava na pia mater, um dos folhetos meníngeos que recobrem o cérebro. Em Troilo e Créssida (ato 2, cena 1) ele critica Ajax de Thersites: “Sua pia mater não é digna de um décimo de um pássaro”. Mais popular foi a ideia que a alma reside nos fluidos que enchem os ventrículos cerebrais. Os ventrículos, pensavam alguns clérigos, era um lugar no cérebro que parecia ter espaço suficiente para abrigar a alma. Todos têm uma teoria acerca do relacionamento entre o cérebro e a alma, e a maioria deles foi horrivelmente imprópria. Na verdade, foi sugerido que, ao menos nas ciências cerebrais, “a grandeza de um homem é somente medida pela quantia de tempo que sua ideia impede seu progresso.”

Alguns poderiam argumentar que tal definição de grandeza ainda é relevante para o cérebro ou para a neurociência, mas ninguém pode negar o seu dramático desenvolvimento nos últimos dois séculos. Este progresso pode ser atribuído, em parte, aos avanços tecnológicos. Microscópios eletrônicos, PETscans, e novos aparelhos de imagem têm criado uma janela para o cérebro, sem paralelo. Apenas há poucas décadas tínhamos nosso primeiro vislumbre do modo que as células nervosas se comunicavam umas com as outras. Hoje a pesquisa do cérebro é reveladora dos mistérios dos fundamentos genéticos que dá suporte àquelas células e descobre os níveis das substâncias químicas que estão envolvidas na rede de comunicação cerebral. Armados com esta sofisticação tecnológica, os estudiosos do cérebro têm capacidade de saciar sua curiosidade científica com “rédeas soltas”. O resultado tem sido o fundamento da pesquisa pura que, nos próximos 20 anos, muito provavelmente levará a avanços que salvam vidas em doenças tais como Alzheimer e Parkinson. Para estudiosos dos cérebro estes são, na verdade, tempos “inebriantes”.

Como espectadores podem não saber a diferença entre tomografia por emissão de pósitron e de potenciais evocados, a extensão de nosso interesse nas ciências cerebrais poderia ser de sentarmos nas arquibancadas e aplaudir. Não entendemos o que os cientistas do cérebro estão fazendo, mas parece bom, e os comentários ocasionais sobre a possibilidade de aplicação da pesquisa são particularmente encorajadores. Assim, nós dizemos, “mantenham o bom trabalho; e que o Instituto Nacional de Saúde possa conseguir mais e mais dinheiro”. Isto, entretanto, não é dizer o suficiente.

O QUE DIZ A PALAVRA DE DEUS?

Embora as ciências cerebrais sejam sofisticadas e impressionantes, a premissa deste livro é que elas estão debaixo de algo muito mais espetacular. Elas estão debaixo da Bíblia, e seus resultados deveriam ser avaliados através da grade de interpretação das categorias bíblicas. Elas podem parecer audaciosas de início. Afinal, o que poderia a Bíblia oferecer às ciências cerebrais, especialmente considerando-se as evidentes ideias erradas do cérebro e da alma que foram prevalentes nos tempos bíblicos? Não faria mais sentido dizer que a Bíblia é autoritativa no reino espiritual, e as ciências cerebrais são autoritativas quanto ao cérebro? Isso pode soar plausível, no entanto soa mais como uma solução de acomodação onde na realidade se rebaixa o Deus da Escritura e exalta a visão humana. Seria como dizer:

“Existem algumas áreas de investigação onde não perguntarei primeiro – o que Deus diz?” A verdade é que todo o conhecimento começa, conforme indicado em Provérbios, com “o temor do Senhor”. Todo conhecimento começa com primeiro se perguntando – “O que diz o Senhor? Como Deus quer que vejamos isso?” É assim que estudamos sobre sexo, dinheiro e economia, política, e tudo o mais que seja digno de um pensar cuidadoso. Tudo na vida deveria estar debaixo da autoridade da Escritura.

Figura – Três possíveis relacionamentos entre Bíblia e ciência.

O problema em estabelecer uma supervisão bíblica da ciência cerebral é que, à primeira vista, parece haver muito poucos princípios bíblicos disponíveis para nos guiar. Aqui estão três deles:

1. Deus criou todas as coisas. Portanto, Deus criou o cérebro.

2. Deus nos chamou para sermos estudantes da criação. Portanto, criação, inclusive o cérebro, pode ser estudada e parcialmente entendida.

3. Estudantes da palavra de Deus devem ser pessoas de integridade e que falam a verdade. Portanto, cientistas deveriam ser cuidadosos em suas investigações e verdadeiros em reportar seus resultados. Eles não deveriam fabricar ou distorcer resultados a fim de agradar suas agendas.

Estes são bons e verdadeiros princípios, mas eles não nos ajudam a trazer sabedoria da Bíblia para dentro de uma discussão mais técnica. O resultado é que, embora em teoria coloquemos a Bíblia acima das ciências cerebrais, na prática nós não usamos a palavra de Deus para controlar a interpretação dos dados neurocientíficos. A Bíblia acaba parecendo com um chefe de estado que não tem poder verdadeiro – um rei fantoche, na melhor das hipóteses.

Infelizmente, a Bíblia tem perdido sua autoridade funcional nas ciências biológicas há bastante tempo. Nosso ponto de virada foi na epidemia de cólera nos anos 1800. Durante as primeiras duas epidemias em 1832 e 1849, a igreja foi considerada o intérprete autoritativo e orientador da epidemia. Tristemente, a partir desta prestigiosa posição, a igreja saiu com explicações simplistas e incompletas. Ela costumeiramente explicava o surto de cólera como evidência da retribuição divina contra o pecado. Isto foi especialmente conveniente, pois costumeiramente as classes mais baixas que foram afetadas, não o povo da classe média e alta financeiramente estável que eram os membros típicos da igreja.

Apesar de ser verdade que a doença pode ser um resultado da disciplina divina e pode indicar uma necessidade por sondar nossa alma e arrepender-se, é também verdade que a doença pode não estar relacionada ao pecado pessoal. Na verdade, dizer que doença é sempre o resultado de pecado pessoal é, de fato, uma velha heresia que remonta ao tempo de Jó e seus conselheiros. Então, por que a igreja não ensinou nos anos 1800 que pecado e doença não estão necessariamente relacionados? Por que não encorajou observações precisas do mundo criado (embora caído) de maneira a haver pleno entendimento das epidemias? Talvez as lentes teológicas da igreja não fossem refinadas e eram incapazes de interpretar aqueles problemas significativamente.

Este uso inexato da Escritura eventualmente teve seu preço. Pelo ano de 1866 da epidemia de cólera, ninguém buscou na igreja por respostas úteis. Ao contrário, o foco mudou para as iniciativas da saúde pública, e o reino do governo legítimo da Escritura foi desse modo estreitado. Em vez da Escritura reinar sobre esta, a ciência reinava em seu próprio reino, e à Escritura foi dado um pequeno pedaço menor que uma propriedade privada.

Deus ainda estava nos céus, como a maioria dos americanos se apressariam em afirmar. Ainda que de fato sua existência tenha cessado de ser uma realidade central e significante em suas vidas. Os alertas da perspicácia divina em 1832 mostraram-se justificados; preocupações materiais e hábitos empíricos de pensamento não apenas tinham sido bastante enganosos como deslocaram as preocupações espirituais das gerações anteriores. Os americanos pareciam estar bem no caminho para se tornar a terra do “ateísmo prático”.

Hoje nas ciências cerebrais a situação é similar. A Bíblia não foi derrotada, porém se tornou irrelevante. Muitos pesquisadores não encontram mais utilidade para ideia de alma imaterial. Todos os nossos comportamentos são alegadamente explicados pela química cerebral e pela física.

Você tem familiaridade com pesquisa em alcoolismo? A pesquisa em si é fascinante, mas pode chegar à nossa porta envolta numa teoria que diz que não há alma. Beber até a intoxicação agora é chamado de doença que vem do corpo, não da alma. Se você for sugerir que pecado causa embriaguez, você poderá ser saudado do modo que os modernos possam saudar Estratão de Lâmpsaco e sua teoria da sobrancelha. Você poderia ser um curioso, embora uma irrelevante voz vinda do passado.

Considere alguns outros problemas práticos. Digamos que um pastor esteja aconselhando um membro feminina da igreja que está bastante deprimida. Por anos eles têm lutado juntos, confiantes que existem respostas bíblicas para a depressão dela. Então um vizinho da pessoa deprimida lhe conta de sua própria experiência com uma medicação antidepressiva. A mulher deprimida vai ao psiquiatra de seu vizinho, começa a tomar medicamento e sua depressão a deixa. Está fora de questão que esta mulher vai considerar a ciência cerebral como sendo mais visionária e autoritativa em relação a seu problema, do que a Bíblia. Ela tinha tentado ambos, e a medicação se mostrou mais eficaz.

O que poderíamos falar sobre o estudo de caso de abertura no livro Listening to Prozac [Ouvindo o Prozac]? É descrito um homem cujo interesse em pornografia termina logo após começar a tomar uma droga. Você pensa que este homem sempre chamará a pornografia de pecado? Claro que não. Não foi uma mudança espiritual que removeu seu desejo; foi a medicação que manipulou a química cerebral. Portanto, ele questionará, se alma existe de fato, e se pode ser mudada pela prescrição medicamentosa, não pela pregação do Evangelho.

E a lista continua. Você já conhece os debates acerca da base biológica da homossexualidade. Você sabia que ira, desobediência aos pais, ansiedade, abuso de drogas, furto e adultério são também apontados como problemas cerebrais em vez de problemas relacionados com o pecado? A pesquisa do cérebro raramente por si mesma tira essas conclusões. Mas, uma vez que a pesquisa é sussurrada até o noticiário das seis horas, e para popular psique, é muito frequente ser circundada por estas interpretações.

Hoje em dia, como cristãos, queremos evitar ouvir o erro eclesiástico de 1800. Desta vez, queremos ouvir o que as pessoas estão dizendo acerca do cérebro, desenvolver claras e poderosas categorias bíblicas, e abençoar a ciência e a igreja neste processo.

A CULPA É DO CÉREBRO?

Distinguindo desiquilíbrios químicos, distúrbios cerebrais e desobediência

Pesquisas sugerem que mais e mais comportamentos são causados pela função ou disfunção cerebral. Mas é sempre legítimo culpar o cérebro pelo mau comportamento? Como posso saber se o “meu cérebro me faz fazer isso”? Enxergando problemas cerebrais por meio das lentes das Escrituras, Edward T. Welch faz distinção entre os distúrbios cerebrais genuínos e os problemas enraizados no coração. Entender essa distinção permitirá que pastores, conselheiros, famílias e amigos ajudem os outros – ou a si mesmos – a lidar com as suas lutas e responsabilidades pessoais. Enquanto se concentra em alguns distúrbios comuns, Dr. Welch apresenta um conjunto de medidas práticas adaptáveis a uma série de condições, hábitos ou vícios.

Uma Busca Enganosa

Uma Busca Enganosa

Todos buscam aquilo que acreditam que lhes trará felicidade. Buscamos em muitos lugares e durante muito tempo por algo que acreditamos nos dar satisfação. O que seria, não sabemos. Apenas sabemos que algo está faltando. Continuamos procurando, sempre em busca de algo, sem jamais encontrar satisfação real nas coisas mundanas. Ou tentamos preencher este vácuo com relacionamentos importantes. De repente, encontramos alguém especial; nos apaixonamos; casamos e esperamos que essa nova pessoa preencha o vazio dentro de nós.

Podemos ainda tentar preencher essa lacuna com uma carreira promissora. Ou pensar que o nosso vazio pode ser preenchido com dinheiro e religião. Talvez, se tivéssemos m0ais dinheiro na conta bancária, seríamos mais felizes. Talvez busquemos preencher esse vazio interno ocupando nosso calendário com atividades religiosas. Podemos até começar a frequentar uma igreja, ou até participar do grupo de estudo bíblico ou ainda tentar preencher essa lacuna existencial recorrendo a vícios destrutivos.

Talvez busquemos emoções nas drogas, ou em apostas inconsequentes em jogatinas. Podemos ter um caso extraconjugal. Decidimos quebrar as regras. O que quer que façamos, estamos sempre em busca de um êxtase emocional que essas coisas podem oferecer. Essa busca fútil pelo que está faltando em nossas vidas aponta para um eminente homem que viveu há dois mil anos. À primeira vista, ele era a pessoa menos provável a precisar nascer de novo. Esse homem era estritamente religioso e altamente bem-sucedido, um homem de moral ilibada e muito respeitado por todos.

Ele sabia muito sobre Deus e tinha uma cabeça cheia de conhecimento sobre as Escrituras, sabia a Bíblia de cor, melhor do que qualquer outra pessoa. Ele era um líder espiritual, reverenciado por todos que o conheciam. Seu nome era Nicodemos. Porém, esse indivíduo próspero sabia que algo estava faltando. O que quer que fosse esse algo, ele não sabia do que se tratava. Nicodemos era muito bem relacionado no nível político mais elevado da estrutura vigente e se encontrava no topo da hierarquia religiosa de sua época.

Ele era reverenciado por causa de seu status elevado e de sua notória influência. Todas as classes da sociedade o admiravam, de escravos a advogados, até líderes religiosos, pois ele tinha todas as respostas espirituais capazes de resolver seus problemas. Eles o procuravam para que lhes falasse sobre Deus, para que lhes interpretasse as Escrituras. Queriam que ele lhes dissesse o que a Bíblia queria dizer. Todos o escutavam falar sobre como se deve viver. No entanto, Nicodemos tinha tantas perguntas sem respostas quanto qualquer outra pessoa — talvez até mais.

Ele havia procurado em todo lugar por essas respostas, até mesmo na religião. Mesmo em sua busca por viver uma vida correta, ele não achou nada que satisfizesse sua alma vazia. Essa insatisfação esmagava suas entranhas, como se o devorasse vivo. Onde poderia Nicodemos encontrar suas respostas? Ele ouvira falar de Jesus de Nazaré. Aliás, quem não tinha ouvido falar? Todos o conheciam. Não se falava em outra coisa. Nicodemos certamente havia recebido relatos sobre os ensinamentos profundos daquele mestre itinerante e ouvira falar dos milagres; ele sabia das numerosas multidões que seguiam Jesus por toda parte.

Dadas essas credenciais, Nicodemos tinha que conhecê-lo.Porém, tal encontro precisava ser secreto. Uma pessoa como Nicodemos não poderia ser vista com Jesus, pois isso certamente comprometeria sua imagem. Esse encontro secreto precisava acontecer dentro das cortinas da noite. Em sua busca frenética por aquilo que faltava, Nicodemos esperava encontrar resposta naquele pregador peregrino. Ele queria que Jesus o apontasse a direção certa, ou que talvez o oferecesse uma nova perspectiva ou compartilhasse alguns pontos de vista, ou ainda que lhe sugerisse alguns passos práticos.

Você também está em busca de respostas? Está exausto de procurar significado na vida? Eu o encorajo a buscar aquele que conhece a verdade. Olhe apenas para aquele que tem as respostas daquilo que falta na sua vida. Estou falando do próprio Criador da vida. Eu te desafio a ouvir o que Jesus disse a Nicodemos, porque é exatamente o que ele diria a você.

Aquilo que Nicodemos buscava há dois milênio, é precisamente o que necessitamos hoje. A natureza humana não mudou; nossas necessidades são as mesmas; não precisamos de instruções de autoajuda; não precisamos meramente mudar nosso comportamento; não precisamos de uma vida melhor ou de sucesso ou de um novo desafio. Antes, o que precisamos é da vida nova que somente Deus pode nos oferecer. Precisamos da vida que é distinta de tudo aquilo que o mundo pode nos dar, uma vida radicalmente diferente de tudo que tenhamos experimentado antes. Precisamos de vida eterna. E esta vida nova vem exclusivamente através do novo nascimento. Enquanto examinamos este encontro entre Jesus e Nicodemos, podemos descobrir verdades sobre o nosso passado. Antes de nascermos de novo, não éramos diferentes daquele velho líder religioso. Ao sermos apresentados a Nicodemos, aprenderemos muito sobre nossa vida passada, se estivermos em Cristo. O que aquele homem precisava descobrir, há tantos anos, é o que experimentamos em nossas vidas através do novo nascimento.

(Texto adaptado a partir do capítulo 2 do livro “Vida Nova em Cristo” de Steven Lawson. O livro é um estudo na passagem de João 3, onde é registrada a conversa de Nicodemos com Jesus.)

Vida Nova em Cristo – Steven J. Lawson

Sobre o livro:
O que acontece quando confiamos em Cristo para a salvação? O evento mais importante na vida de uma pessoa é o novo nascimento. No entanto, muitos cristãos teriam dificuldade em descrever exatamente o que é esse evento, sobretudo o que ele significa para os próximos passos de sua caminhada com Deus.

• O que acontece quando nascemos de novo?
• Tudo em nossa vida muda imediatamente?
• É apenas uma espécie de recomeço espiritual, uma nova chance para tentar acertar?
• O que acontece quando fracassamos? Isso significa que, essencialmente, não nascemos de novo?

Com um coração pastoral e a visão aguçada de um mestre, Steven Lawson examina cuidadosamente o encontro entre Jesus e Nicodemos, como descrito no capítulo 3 do evangelho de João, para descobrir a natureza desse novo nascimento espiritual. Steve nos mostra a necessidade do novo nascimento, como Deus muda nosso coração por meio dele e o que vem depois, desde o batismo e o envolvimento numa igreja local até o modo como devemos lidar com dúvidas e problemas.

Tragédia e Trauma

Tragédia e Trauma

Na manhã de segunda-feira após o Dia das Mães de 2013, a vida começou normalmente na casa dos Lowe. Estávamos correndo para nos preparar para a escola e para o trabalho, cuidando de nosso zoológico de animais de estimação e fazendo uma lista das tarefas do dia. Vivemos uma vida plena com cinco filhos, dois cachorros, dois gatos, três pássaros e dois coelhinhos. Eu estava de férias e ansioso para descansar do trabalho e ter tempo para fazer coisas para as quais nunca tenho tempo.

Mas meu dia não saiu como esperado. Ao meio-dia, eu estava observando sete bombeiros fazerem uma tentativa frenética de salvar nossa casa. Infelizmente, isso não aconteceria. Durante cinco horas, assistimos a um incêndio devastar toda a nossa casa. Memórias que criamos nos últimos sete anos passaram pela minha mente enquanto tudo queimava. Senti uma dor e uma culpa avassaladoras porque não estava em casa quando o incêndio começou. Eu não estava lá para salvar nossos queridos animais de estimação.

Vi bombeiros arriscarem suas vidas para salvar nossa casa, enquanto vizinhos filmavam e tiravam fotos de nossa tragédia. Eu estava em um estado de total descrença. Minha mente rapidamente se voltou para meus filhos. Como posso dizer a cinco crianças que tudo o que deixaram para trás naquela manhã desapareceu? Como posso prepará-los para enfrentar o fato de que seus brinquedos foram destruídos, os animais de estimação que eles adoravam morreram e o lugar onde nos reunimos como família desapareceu?

É difícil pintar um quadro suficientemente vívido de como foi aquele dia, muito menos das experiências contínuas que se seguiram. Naquele dia, comecei a sentir uma série de emoções com as quais não estava preparado para lidar, e muitas vezes ainda sinto as repercussões da nossa perda. Não foi tanto o fato de termos perdido todos os nossos bens materiais e físicos: os álbuns de casamento, as fotos de família, as Bíblias favoritas, as relíquias de família e os tesouros de infância.

Embora perder tudo isso tenha sido difícil, a perda mais significativa veio do trauma de ver tanta coisa que eu amava destruída bem na minha frente. É a lembrança de ver aquele incêndio ir de mal a pior. São as horas gastas diante de uma crise, incapazes de mudar seu desfecho. É viver com os “se” e ” e se”. Ficava voltado o dia na minha imaginação repetidas vezes como se eu pudesse criar um final alternativo.

O trauma do incêndio destruiu a sensação de segurança e estabilidade que eu tinha. Houve esta clara percepção de que o mundo é um lugar perigoso e precário. Qualquer sensação de segurança que eu mantivesse era uma farsa. A vida virou de cabeça para baixo de tantas maneiras que se tornou difícil quantificar e capturar para que outros entendessem.

Mesmo assim, a vida continuou. E os desafios continuaram chegando. Poucas semanas após o incêndio, nosso filho foi diagnosticado com uma doença ocular progressiva e degenerativa. A fragilidade da vida estava novamente na nossa cara. Estávamos cambaleando. Não duvidamos de Deus ou de sua bondade. Não ficamos com raiva dele. Nem tenho certeza se conseguiria questioná-lo, embora tivesse muitas perguntas.

Estávamos simplesmente sofrendo. O que precisávamos? Como processar uma perda assim? Precisávamos encontrar a capacidade de sofrer e encontrar conforto no Senhor. Derramar lágrimas e ainda confiar. Estar confuso, mas saber que nossa esperança era certa. Para segurar a tristeza e a crença. Acredito que esta seja a complexidade de conviver com a perda. Tristeza expressa em esperança.

Precisávamos de pessoas que nos entendessem, que nos ajudassem a pensar com clareza quando éramos incapazes e que não nos julgassem infiéis quando lutássemos — e lutámos mesmo. Isto lembrou-me que Deus chama cada um de nós a ter empatia com outros sofredores – aqueles que perderam um filho ou cônjuge, sobreviveram a uma experiência trágica, viveram uma guerra ou um genocídio.

Como crentes e conselheiros bíblicos, devemos caminhar ao lado e nos oferecer como sofredores, processando e curando. Leva tempo para compreender, ouvir e ajudar os sobreviventes a encontrar conforto e esperança. Perdas trágicas não são superadas em poucas semanas, ou mesmo em alguns meses. A cada novo evento ou estação da vida, a perda é vivenciada em um novo nível. Esta tem sido definitivamente a minha experiência.

Portanto, ao sofrermos e ao ministrarmos aos que sofrem, possamos ser pessoas que apontam uns aos outros para Aquele que está no controle, redimindo tudo o que foi perdido. E que possamos ser consolados porque, embora suportemos inúmeras perdas dolorosas, nunca perderemos Aquele que nos ama e que nunca nos abandona.

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Texto publicado originalmente por Julie Lowe no blog da CCEF em 14 de Abril de 2016.

Julie Lowe é membro do corpo docente da CCEF e mestre em aconselhamento pelo Biblical Theological Seminary. Ela é conselheira profissional licenciada com quase vinte anos de experiência em aconselhamento. Julie também é terapeuta registrada e desenvolveu um consultório de terapia na CCEF para melhor atender famílias, adolescentes e crianças. Julie e seu marido, Greg têm seis filhos e servem como pais adotivos. Ela é autora dos livros “Criando Filhos pela Fé e não por Fórmulas” (Peregrino) e “Construindo Pontes” (Fiel).

Conheça também o livro “Criando Filhos pela Fé e não por Fórmulas” de Julie Lowe

Este livro trata da liberdade de fórmulas para mães, pais e cuidadores de crianças de todas as idades. Criando Filhos pela Fé, Não por Fórmulas fornece insight bíblico e incentivo para os leitores que desejam criar seus filhos pela fé. Como conselheira experiente de crianças e famílias, mãe adotiva e filha adotiva que aplica o modelo de mudança bíblica da CCEF, Julie Lowe usa as Escrituras e a sabedoria bíblica para ensinar cuidadores a conhecerem seus filhos e, especificamente, amá-los com o amor de Cristo.

Um encorajamento às Mães

Um encorajamento às Mães

O papel de mãe e dona de casa em nossa sociedade tem sido extremamente desprezado, diminuído, destituído de sua beleza celestial. Por isso, como mães, devemos tomar nossa carga de responsabilidade e incutir as verdades bíblicas nos corações das crianças, adolescentes e jovens, lutando firmemente contra a vontade do mundo de moldar a opinião dos nossos filhos. O que o mundo tem dito para as meninas no que se refere a seu papel na sociedade? Você já parou para pensar nisso? Que elas devem ser iguais aos homens, lutar para se destacar profissionalmente, para que não precisem depender de ninguém (principalmente de um homem).

Não entraremos, aqui, na questão da igualdade de gêneros e de quais escolhas profissionais são válidas às mulheres cristãs. O ponto é que essas ideias vão, ainda que discretamente, contra o princípio bíblico de a mulher ser uma boa dona de casa. Veja, nem sempre é uma pregação aberta contra a domesticidade, mas, por caminhos tortuosos, Satanás tenta incutir na cabeça das mulheres (meninas, jovens, maduras) que o trabalho do lar é vergonhoso e sem valor, não se comparando a outra carreira qualquer. E sabemos que não é isso que o nosso Senhor pensa. É nessa luta que queremos encorajar cada mãe. Ensine a seus filhos o valor do lar e do trabalho dedicado a ele, de forma que isso seja uma meta almejada por eles.

Nós temos a obrigação de fazer todo esforço para criar uma próxima geração de adoradores de Deus, que vejam a vida como ele diz, e não sob uma ótica corrompida pelo pecado. Lembre-se: “pois a nossa luta não é contra seres humanos, mas contra os poderes e autoridades, contra os dominadores deste mundo de trevas, contra as forças espirituais do mal nas regiões celestiais” (Ef 6.12).

 

ENSINANDO AOS MENINOS O VALOR DO LAR

Talvez você tenha pensado que falaríamos apenas para mães de meninas… mas não! O ensino deve ser desenvolvido com meninos também. Conhecemos homens que não têm a menor ideia de como se cuida de uma casa, não sabem como lavar louças, fazer arroz ou sequer arrumar uma cama. Isso é algo preocupante. Essa falta de orientação acarreta dois problemas maiores: homens que não reconhecem o valor do trabalho que uma mulher tem ao cuidar do lar, e homens que não fazem absolutamente nada dentro de casa, pois acham que isso não tem nada a ver com eles. Deus deu a ordem para as mulheres serem boas donas de casa, e reconhecemos que essa tarefa é primordialmente feminina. Mas isso não exclui o homem de trabalhar dentro de casa e ser parte integrante do funcionamento do lar. Quando lemos 1Pedro 3.7, percebemos que o homem deve se preocupar com sua esposa ao ponto de agir: “Do mesmo modo vocês, maridos, sejam sábios no convívio com suas mulheres e tratem-nas com honra, como parte mais frágil e co-herdeiras do dom da graça da vida, de forma que não sejam interrompidas as suas orações”.

Leia novamente: “sejam sábios no convívio com suas mulheres e tratem-nas com honra”. Será que esses dois pontos são características de um marido que não faz nenhuma tarefa do lar quando está em casa, ainda que cumpra sua função de provedor? Há outra tradução da Bíblia que usa, nesse mesmo versículo, a expressão “vivei a vida comum do lar” (ARA). Lavar a louça, recolher o lixo e pendurar as toalhas são realidades que fazem parte da “vida comum do lar”. Podemos compreender que o papel do homem nas questões práticas da casa não se limita a ser o provedor financeiro. Ele também deve ser ativo, em amor, quando está em casa. E o amor também se mostra no serviço ao próximo, sendo sua esposa, sem dúvida, aquela a quem ele deve amar e cuidar com maior zelo. Como mães, nós precisamos ensinar nossos filhos homens a serem úteis dentro de casa, trabalhando com suas mãos para demonstrar amor aos que moram com ele. Isso é colocar em prática Mateus 22.39b, “Ame o seu próximo como a si mesmo”. Precisamos ensinar aos meninos como dobrar as roupas, como arrumar a cama ao acordar, como lavar as louças às sextas-feiras, como limpar o banheiro uma vez por mês, ainda que eles não sejam (e talvez nunca se tornem) os principais responsáveis por essas tarefas.

Também precisamos ensinar nossos filhos a perceber quando há algo a ser feito ou quando alguém da família precisa de ajuda. Ensine seu filho a ser pró-ativo em casa, pois isso lhe será útil em todas as outras esferas da sua vida. Com certeza, esse ensino específico será uma bênção na vida dele, principalmente quando for adulto. Vai ajudá-lo a não ser preguiçoso (veja Pv 6.6-11; 10.4,5; 12.11,24; 13.4; 14.23; 18.9; 20.13) nem em casa, nem no trabalho, nem na igreja. Vai incutir em seu coração a ideia de trabalhar pensando no outro, e não apenas em si mesmo (Mt 22.39b). Veja como podemos, através de uma simples pilha de roupas para dobrar, chegar ao coração da criança e fazê-la entender, na prática, como ser um adorador do Deus trino! Glórias ao Senhor por isso! Quando criamos meninos que servem dentro de casa, estamos trabalhando para que eles se tornem homens que, se chegarem a se casar, verão com apreço o serviço de suas esposas e agirão com sabedoria na vida doméstica. Faça isso por sua nora, ainda que pareça uma realidade distante. E, mesmo que seu filho não se case, você o estará preparando para uma vida adulta mais tranquila, pois ele saberá como comandar uma casa e fazer as coisas comuns de um lar.

 

ENSINANDO ÀS MENINAS A VERDADEIRA RIQUEZA DO LAR

Por favor, não nos entenda mal: nós temos formação acadêmica, desenvolvemos trabalhos fora da esfera doméstica e gostamos muito de investir em nossas carreiras, em diversos projetos profissionais. Da mesma forma, incentivamos nossas filhas aos estudos e à busca de aspirações profissionais. Não cremos que o casamento é o que Deus tem preparado para todas as mulheres, e nem que isso deva ser sua maior aspiração. Queremos que nossas filhas sejam inteligentes do ponto de vista acadêmico. Mas, acima disso, queremos que elas sejam sábias, do ponto de vista bíblico!

Por isso, cremos que TODAS as mulheres devem ser preparadas e incentivadas a serem boas donas de casa, dando o valor que o Senhor dá a esse papel, de forma que ele nunca seja deixado de fora das prioridades da vida feminina. Como mães de meninas, mais do que em qualquer outra situação, devemos colocar em prática, diariamente, Tito 2.3-5:

“Semelhantemente, ensine as mulheres mais velhas a serem reverentes na sua maneira de viver, a não serem caluniadoras nem escravizadas a muito vinho, mas a serem capazes de ensinar o que é bom. Assim, poderão orientar as mulheres mais jovens a amarem seus maridos e seus filhos, a serem prudentes e puras, a estarem ocupadas em casa, e a serem bondosas e sujeitas a seus maridos, a fim de que a palavra de Deus não seja difamada.”

Nós, mães, somos as mais velhas e temos muitas coisas a ensinar às nossas filhas mais novas, não é mesmo? Pense no quanto você incentiva sua filha nos estudos e nos esportes. É com a mesma intensidade que você a incentiva a aprender a cozinhar e a manter a ordem do armário? Você dá mais valor a uma nota alta do que às tarefas que ela precisa fazer em casa? O que isso diz à sua filha sobre o valor do trabalho no lar? Pois é, são perguntas difíceis para todas nós. Mas necessárias, para que possamos avaliar nossa caminhada até aqui. Dedique-se a inculcar no coração da sua filha o que Deus espera dela, conforme está descrito, parte por parte, em Tito 2!

A ideal feminilidade não é aquela pregada em seriados ou novelas. Ser uma grande mulher não é ser independente de todos e chegar ao mais alto cargo que exista. Ser uma mulher de sucesso é ser exatamente como Deus nos preparou para sermos, em toda a sua perfeita ideia. E ele nos preparou para sermos, entre outras coisas, boas donas de casa. Almejar isso é buscar o eterno, pois glorifica a Deus. Temos o dever, perante o Senhor, de mostrar essas verdades às nossas filhas e às jovens que estiverem próximas a nós. Precisamos ensinar que aquilo que o Senhor disse que é bom, é o melhor!

Tanto mostrando com nossa vida, como em ensino verbal e exortação. E como fazer isso na prática? Primeiro com o próprio serviço e sem murmuração. Será que uma filha vai achar que é bom cuidar das roupas quando vê a mãe, dia após dia, reclamando em alta voz do quanto é chato estender roupas, e do quanto ela odeia dobrar a pilha de meias sem par? Será que uma filha vai achar que há graça no trabalho diário de arrumar as camas e organizar os lanches, quando a mãe o faz com cara brava, murmurando constantemente sobre o quanto odeia sua vida? Pois é, o primeiro passo é buscar no Senhor o contentamento e realizar suas tarefas lembrando que elas são feitas em honra dele. Sabemos que há dias difíceis, tarefas que realmente exigem muito sacrifício, e não estamos sugerindo que você minta ou faça “cara de paisagem” todos os dias. Mas a murmuração é pecado, mostra ingratidão contra Deus.

Quando isso acontecer na frente dos seus filhos, após pedir perdão a Deus – que é sempre o primeiro a quem ofendemos com nosso pecado –, converse com o filho que presenciou seu pecado, peça perdão e mostre a ele o quanto é importante obedecer a Deus mesmo quando não queremos. Amor sacrificial pode ser ensinado até em situações em que falhamos. Mas, além do exemplo, reserve momentos de ensino intencional. Planeje o que você quer ensinar e quais propósitos quer atingir no coração da sua filha. E isso deve ser feito mesmo pelas mulheres que não trabalham exclusivamente em casa, e que têm ajuda de outras pessoas no lar. Por exemplo, separe tempo específico com o propósito de ensinar sua filha a dobrar as roupas e colocar nos armários. Mostre como isso facilita sua vida nos outros dias e ensine que manter a organização fará com que ela demonstre apreço por seu próprio trabalho e pelo trabalho das outras pessoas da casa.

Outro exemplo: escolha um dia e leve sua filha para arrumar as camas junto com você. Depois que ela já tiver aprendido, escolha um sábado e peça para que ela seja a responsável por arrumar a cama dos pais, para que eles possam ter um café da manhã mais longo e tranquilo. Enfim, mostre na prática como limpar o banheiro, como estender as roupas, como lavar a louça ou colocá-la na lava-louças. E, a cada ensino, relembre-a que fazer as tarefas em amor e sacrifício é fazer de forma que agrada e glorifica a Deus.

 

CONTINUE FIRME

Se não ensinarmos aos nossos filhos, meninos e meninas, o valor do trabalho doméstico, se não inculcarmos desde sempre que essa é uma parte muito importante da vida (especialmente das mulheres), como podemos esperar que eles vivam conforme Deus mandou? 

Mas, se ensinarmos, colheremos frutos! Quanta esperança traz aos nossos corações Provérbios 22.6: “Ensina a criança no caminho em que deve andar, e, ainda quando for velho, não se desviará dele” (ARA). Esse versículo não garante a salvação para os filhos de pais cristãos que se esforçam no ensino fiel da Palavra, entretanto, mostra como o trabalho investido na vida de cada filho ficará para sempre marcado em seu coração, sendo uma bússola constante para que o filho perceba para onde seu caminhar tem pendido. 

Quantas de nós fomos ensinadas a amar nossos lares e dar o suor no nosso trabalho doméstico como forma de honrar ao Senhor e amar aqueles que habitam conosco? Se você foi ensinada nesse sentido, glória a Deus, pois uma serva fiel obedeceu a Tito 2 investindo na sua vida! Se você não foi, pense que, na sua família, você pode ser a primeira geração de mulheres que lutam pela obediência irrestrita à Palavra de Deus!

Continuemos firmes: nosso trabalho como mães é fundamental no plano que Deus estabeleceu para seu povo, dentro de cada lar. E, assim, temos o privilégio de usar a Palavra de Deus na vida prática, para atingir do lar ao coração!

(Texto extraído e adaptado do livro “Do Lar ao Coração” de Aletea Mattes e Fabiane Mendes, páginas 127 a 135)

DO LAR AO CORAÇÃO: OLHANDO PARA A DECORAÇÃO E ORDEM DA CASA A PARTIR DA BÍBLIA

É comum as mulheres experimentarem emoções conflitantes diante dos seus desafios no cuidado do lar. Por vezes, se sentem sufocadas nas intermináveis tarefas que a administração doméstica exige. Outras vezes, exasperam-se pela falta de reconhecimento do seu árduo trabalho. Diante de tudo isso, como encarar o grande desafio que a mulher tem dentro do lar? Há somente um caminho: através da sabedoria bíblica. Neste livro, as autoras buscam unir o cuidado do lar àquilo que possui valor eterno. Elas procuram entender biblicamente que a ordem e a estética do lar podem ser vistas como excelentes oportunidades para uma vida cristã significativa. Assim, sem ignorar os detalhes e afazeres diários, destacam o que está muito acima deles: cuidar do lar pela real possibilidade de viver nele dias felizes e surpreendentes!